sábado, 2 de julho de 2011

O MEU DESERTO


O MEU DESERTO

Filho meu que não tenho,
que te perdi no caminho
sem saber como isso foi!

Soltaste-te da minha mão,
tentaste seguir sozinho,
atraiu-te a multidão
onde as luzes brilham mais.

Não sei se me procuraste
em todo este tempo de espera.

Espera que para mim foi deserto
sem sombra,
sem água,
sem primavera.

Tudo lá fora é tisnado,
calcinado,
pelo estio.
Mas, cá dentro,
a secura é bem pior:
os malmequeres e os lírios
que tinha plantado para ti
estão a murchar
no canteiro.

E tu não vens olhar para eles!
Queres que tos vá apanhar?

Filho meu que não tenho:

Vem depressa
com a tua afeição de volta
para que esta lágrima solta
feita de água
e muita mágoa
não role.
E acabe por não cair,
nem abrir
mais rugas fundas em mim.

Olha,
se não demorares,
talvez ainda haja flores no jardim
e te resolvas a escolher
um malmequer,
ou um lírio,
para enfeitares os teus dias.

Quem sabe?

Miguel Leitão
in "O tempo e as coisas"

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