sábado, 28 de agosto de 2010

FESTA NA ALDEIA de Aurora Simões de Matos

Manuel Gómez "Arce"
in: http://salaodaprimaverade2011.blogspot.com


FESTA NA ALDEIA

de Aurora Simões de Matos

Estralejam foguetes, vai a missa a meio,
“já estão os Santos”, dobra a devoção.
A capela é ovo, o adro está cheio;
Unidos em prece nesta comunhão,
Esquecem-se canseiras, distâncias vencidas,
Busca-se alimento para as nossas vidas.

De manhã bem cedo, a aldeia acordou,
ao som de morteiros que estoiram no ar;
os músicos chegam, a festa começou.
Aqueceu-se o forno, pôs-se a carne a assar,
cheiro apetitoso invade os caminhos,
repartem-se mimos pelos pobrezinhos.

Junta-se a família, chamam-se os amigos,
matam-se saudades, do longe se faz perto;
provam-se os petiscos com sabores antigos,
cada lar é hoje mais que um céu aberto.
São horas da missa, ninguém quer faltar,
fatiota nova, vai-se comungar.

E no fim da missa é a Procissão
com andores floridos até ao Cruzeiro.
Lá vão os Santinhos, nossa devoção,
parece que aos ombros vai o mundo inteiro…
Elevam-se preces que sobem ao céu,
nosso padroeiro é São Bartolomeu.

Vai gente descalça pisando a calçada,
cumprindo promessas, lembrando aflições.
Os anjinhos de asas e os da Cruzada
marcham bem certinhos ao som de orações!
Os músicos tocam com solenidade
e Padre João transborda bondade.

Pela tarde adiante, pela noite fora,
a festa continua no adro e na estrada.
Cantares e dançares, pedaços de outrora,
alternam com ritmos para a rapaziada.
Bebe-se uma pinga, compra-se pão-leve
No leilão das prendas que o Santo teve.

É assim a festa de S. Bartolomeu,
Para quem deu esmola… e para quem não deu.

Aurora Simões de Matos,
Imagens da Beira-Paiva

A PEQUENA PRAÇA de Sophia de Mello Breyner Andresen

Pilar López Román
in:http://artistasdacorunhanoporto.blogspot.com/


A PEQUENA PRAÇA

de Sophia de Mello Breyner Andresen

A minha vida tinha tomado a forma da pequena praça,
Naquele Outono em que a tua morte se organizava
meticulosamente.
Eu agarrava-me à praça; porque tu amavas
A humanidade humilde e nostalgia das pequenas lojas
Onde os caixeiros dobram e desdobram fitas e fazendas.
Eu procurava tornar-me tu; porque tu ias morrer
E a vida toda, deixava ali de ser a minha.
Eu procurava sorrir como tu sorrias,
Ao vendedor de jornais ao vendedor de tabaco
E à mulher sem pernas que vendia violetas.
Eu pedia à mulher sem pernas que rezasse por ti
Eu acendia velas em todos os altares
Das igrejas que ficam no canto desta praça
Pois mal abri os olhos e vi foi para ler
A vocação do eterno escrita no teu rosto.
Eu convocava as ruas, os lugares, as gentes
Que foram as testemunhas do teu rosto
Para que eles te chamassem para que eles desfizessem
O tecido que a morte entrelaçava em ti.

REQUIEM PELA AVENIDA DOS ALIADOS de Silvino Martins por Leonor Reis



REQUIEM PELA AVENIDA DOS ALIADOS

de Silvino Martins

por Leonor Reis

Que vento foi o que passou,
bárbaro e insano,
sobre a presença da Avenida
e sem piedade
desterrou,
do coração da cidade,
O pulsar mágico da vida?

Que mão funérea é que a má sorte
deixou que te tocasse
sem que ninguém previsse,
e pusesse
a lividez da morte
no teu rosto
que respirava
beleza e garridice?
Quem transformou
o encanto vivo dos jardins
que enchiam de alegria
os nossos olhos
e de magia
o nosso sentimento
neste deserto
estéril e cinzento?
Pobre espaço
Lírico e sonhador,
que mal fizeste a quem podia,
assim, de ti dispor?
porque pecado te mataram?
com a frieza
que inutiliza qualquer luta
e encerraram
teu coração
ainda pulsante
nem sepulcro assombroso de asperezas,
monotonia e pedra bruta?

Para as lágrimas de quem,
sentindo-se traído,
exprimo, em pranto,
a sua dor, o seu protesto,
não basta certamente
em tanque, em ti,
inútil e perdido…
morto e tão frio como tudo o resto.
Silvino Martins
Funcionário bancário

Luis Pedro Viana


Luis Pedro Viana falou do Minho, de Rosalia de Castro, de Pedro Homem de Melo, de Amália Rodrigues e do seu último livro "Enigma"

Luís Pedro Viana (Pseudónimo)
Nascido em 1943, Viana do Castelo, cursou nas Escolas Industrial e Comercial da cidade, tendo continuado estudos na Escola Académica do Porto, onde efectuou a preparação para ingresso no Instituto Industrial e depois na Faculdade de Ciências, estudos que completou posteriormente, após ter cumprido o serviço militar em Moçambique, durante quatro anos e meio.
Este seu percurso levou-o ao desempenho de funções de administração, ao longo de quarenta anos, para uma mesma empresa no domínio da reciclagem de metais.
Na juventude frequentou o atelier de pintura da fábrica de seu pai, daí o gosto que desenvolveu pela pintura, retrato em várias peças que ainda conserva.
As viagens sempre fizeram parte do seu mundo pelo que aproveitava qualquer oportunidade para visitar museus e galerias, facto que proporcionou (e proporciona) um íntimo contacto com todas as correntes das artes, dos autores clássicos aos modernos ( Paris, Amesterdam, Zurique, Istambul, Palma,Londres, Budapeste, Barcelona, Madrid, Atenas, Lisboa, Porto, entre muitas outras).
Todo o espólio adquirido é material que serve de base e inspiração à sua actividade artística.
Talvez por isso venha a sendo reconhecido e convidado a expor trabalhos de pintura ( Exposições em V.N.Gaia; Viana do Castelo; Vigo – Eixo Atlântico-; Maia –Forum-; Porto –Anarp-). O mesmo tem acontecido com os seus “escritos poéticos”, que com bastante assiduidade têm sido dados à estampa em Revistas e Jornais, como por exemplo, no Jornal de Notícias e Jornal de Matosinhos, nas suas páginas semanais, que contam já com centenas de publicações, no Primeiro Janeiro publicou os contos “Frasco do remédio” e “O homem que comprava o tempo”.
São também da sua autoria os Livros JANELA ABERTA e ENIGMA ( poesia)- Corpos Editora, as capas do livro de Contos de H. M..Larcher - Sinfonia da vida- , de Enigma lançados na FNAC/Porto e de Janela Aberta com apresentação no Café GUARANY, bem como as revistas do Portugal Rotário nº 120 Jan/Fevº- “ EURO 2004”, Dezº 2006 “ NATAL” e Rotay Club V.N.Gaia n º 269 Agosto 2005.
Fui convidado para uma entrevista na Edição comemorativa dos 120 anos do JN, em 2/6/2008, na sequência da qual fui designado por “ O pintor epicurista”.

MANHÃS DE AGOSTO de Maria Antónia de Carvalho Mendes Ribeiro



MANHÃS DE AGOSTO

de Maria Antónia de Carvalho Mendes Ribeiro

Nestas quentes manhãs do mês de Agosto,
Debaixo dos frondosos arvoredos,
Escutando o chilrear da passarada,
E das crianças avistando seus folguedos,
Fico a cismar, embalada nesta calma,
E em todo este ambiente natural.
Como é possível tudo o que acontece
E que eu leio nas noticias do jornal!
São as guerras fraticidas do Kosovo,
É a luta amordaçada de Timor!
Um povo cujo desejo é ser livre
E que vive debaixo do terror!
São os desastres imensos nas estradas!
Dos que correm desafiando a sua sorte,

Para chegar mais cedo, não, à vida,
Mas, muitas vezes, sim, mais cedo à morte!
É a guerra, é a fome, em Angola!
Onde as crianças apanham o milho pelo chão!
Meia dúzia de grão que eles comam,
Representam, li eu, a refeição!
São os crimes, os roubos, tudo enfim,
Que me deixam muito triste e a pensar:
Será que a humanidade está tão louca,
Que já não tem capacidade para amar?
Depois de tudo isto que fui lendo,
Debaixo dos frondosos arvoredos,
Já nem ouço o chilrear da passarada
E mal avisto, das crianças, seus folguedos.

Agosto de 1999

IR POR AÍ de Maria Olinda Sol por Constância Néry



IR POR AÍ

Maria Olinda Sol

por Constância Néry

Por aí eu quero ir
em naves com asas
fazendo voos rasos
nas paisagens espelhadas
nos olhos da vida!
Por aí eu quero ir
antes de cada Verão,
dia sim, dia não,
comer o pão de centeio
embebido em azeite
e mãos fermentadas
pelas horas,
servidas em taças de poesia!
Por aí é que eu quero ir
com canções que florescem
nos cantos nus das cidades,
toadas nos vãos das escadas
fabricando fogueiras
onde antes havia gritos aflitos!
Por aí é que eu vou
criando outros compromissos
em mesas de Domingo Pascal!

A Senhora de Brabante de Gomes Leal por Fernanda Cardoso


A Senhora de Brabante

Gomes Leal

por Fernanda Cardoso

Tem um leque de plumas gloriosas,
na sua mão macia e cintilante,
de anéis de pedras finas preciosas
a Senhora Duquesa de Brabante.

N'uma cadeira d'espaldar dourado,
escuta os galanteios dos barões.
- É noite: e, sob o azul morno e calado,
concebem os jasmins e os corações.

Recorda o senhor Bispo acções passadas.
Falam damas de jóias e cetins.
Tratam barões de festas e caçadas
à moda goda: - aos toques dos clarins.

Mas a Duquesa é triste. - Oculta mágoa
vela seu rosto de um solene véu.
- Ao luar, sobre os tanques chora a água...
- Cantando, os rouxinóis lembram o céu...

Dizem as lendas que Satã vestido
de uma armadura feita de um brilhante,
ousou falar do seu amor florido
à Senhora Duquesa de Brabante.

Dizem que o ouviram ao luar nas águas,
mais louro do que o sol, marmóreo e lindo,
tirar de uma viola estranhas mágoas,
pelas noites que os cravos vêm abrindo...

Dizem mais, que na seda das varetas
do seu leque ducal de mil matizes...
Satã cantara as suas tranças pretas,
- e os seus olhos mais fundos que as raízes!

Mas a Duquesa é triste. - Oculta mágoa
vela seu rosto de um solene véu.
- Ao luar, sobre os tanques chora a água...
- Cantando, os rouxinóis lembram o céu...

O que é certo é que a pálida Senhora,
a transcendente Dama de Brabante,
tem um filho horroroso... e de quem cora
o pai, no escuro, passeando errante.

É um filho horroroso e jamais visto! -
Raquítico, enfezado, excepcional,
todo disforme, excêntrico, malquisto,
- pelos de fera, e uivos de animal!

Parece irmão dos cerdos ou dos ursos,
aborto e horror da brava Natureza...
- Em vão tentam barões, com mil discursos,
desenrugar a fronte da Duquesa.

Sempre a Duquesa é triste. - Oculta mágoa
vela seu rosto de um solene véu.
- Ao luar, sobre os tanques chora a água...
- Cantando, os rouxinóis lembram o céu...

Ora o monstro morreu. - Pelas arcadas
do palácio retinem festas, hinos.
Riem nobres, vilões, pelas estradas.
O próprio pai se ri, ouvindo os sinos...

Riem-se os monges pelo claustro antigo.
Riem vilões trigueiros das charruas.
Riem-se os padres, junto ao seu jazigo.
Riem-se nobres e peões nas ruas.

Riem aias, barões, erguendo os braços.
Riem, nos pátios, os truões também.
Passeia o duque, rindo, nos terraços.
- Só chora o monstro, em alto choro, a mãe!..

Só, sobre o esquife do disforme morto,
chora, sem trégua, a mísera mulher.
Chama os nomes mais ternos ao aborto...
- Mesmo assim feio, a triste mãe o quer!

Só ela chora pelo morto!.. A mágoa
lhe arranca gritos que ninguém mais deu!
- Ao luar, sobre os tanques chora a água...
- Cantando, os rouxinóis lembram o céu...

"A Procissão" de António Lopes Vieira por Lourdes Rocha



"A Procissão"

António Lopes Vieira

por Lourdes Rocha

Tocam os sinos da torre da igreja,
Há rosmaninho e alecrim pelo chão.
Na nossa aldeia que Deus a proteja!
Vai passando a procissão.

Mesmo na frente, marchando a compasso,
De fardas novas, vem o solidó.
Quando o regente lhe acena com o braço,
Logo o trombone faz popó, popó.

Olha os bombeiros, tão bem alinhados!
Que se houver fogo vai tudo num fole.
Trazem ao ombro brilhantes machados,
E os capacetes rebrilham ao sol.
Tocam os sinos na torre da igreja,
Há rosmaninho e alecrim pelo chão.
Na nossa aldeia que Deus a proteja!
Vai passando a procissão.

Olha os irmãos da nossa confraria!
Muito solenes nas opas vermelhas!
Ninguém supôs que nesta aldeia havia
Tantos bigodes e tais sobrancelhas!

Ai, que bonitos que vão os anjinhos!
Com que cuidado os vestiram em casa!
Um deles leva a coroa de espinhos.
E o mais pequeno perdeu uma asa!

Tocam os sinos na torre da igreja,
Há rosmaninho e alecrim pelo chão.
Na nossa aldeia que Deus a proteja!
Vai passando a procissão.

Pelas janelas, as mães e as filhas,
As colchas ricas, formando troféu.
E os lindos rostos, por trás das mantilhas,
Parecem anjos que vieram do Céu!

Com o calor, o Prior aflito.
E o povo ajoelha ao passar o andor.
Não há na aldeia nada mais bonito
Que estes passeios de Nosso Senhor!

Tocam os sinos na torre da igreja,
Há rosmaninho e alecrim pelo chão.
Na nossa aldeia que Deus a proteja!
Já passou a procissão.

EMÍDIO RODRIGUES



EMÍDIO RODRIGUES deu brilho à sessão de "Poesia na Galeria" acompanhando com a sua guitarra alguns êxitos do seu último "CD" (Compromisso)

sexta-feira, 27 de agosto de 2010

AS ESPERAS DO AMOR de Jorge Vieira

AS ESPERAS DO AMOR


Jorge Vieira

Esperas inúteis são horas vencidas,
Por impulsos que o nosso corpo tem;
Loucuras, devaneios, que as nossas vidas,
Vão semeando aqui e além.

Frutos de amor, vértices de ternura,
Lânguidos cansaços, plenos de prazer,
Despertam no calor da noite escura,
Abraçados à fúria de viver.

Quantos corpos desmaiam, sequiosos,
Ao encontro de um amor a construir;
Repletos de silêncios e desejosos
Da vontade de ser e de existir.

Mãos que se unem em harmonia,
São cadeias de gestos repetidos,
Que cobertos de dor e alegria,
Alimentam a força dos sentidos.

quinta-feira, 26 de agosto de 2010

SONETO A CAMÕES de Augusto Frederico Schmidt por Artur Santos

SONETO A CAMÕES


Augusto Frederico Schmidt

As tuas mágoas de amor, teus sentimentos
Diante das leis que regem nossas vidas,
Desses fados que dão e logo tiram,
E a que estamos escravos e sujeitos.

As tuas dores de amar sem ser amado,
De procurar um bem que não se alcança,
E no canto clamar desesperado
Pelo que nunca quando se busca.

Poeta de enamoradas impossíveis
E que num negro amor desalteraste
Essa sede de amar dura e terrível,

As tuas mágoas de amor, tuas fundas queixas,
Como uma fonte ficarão chorando
Dentro da língua que tornaste eterna.

No Caminho, com Maiakóvski

BEM-AVENTURADO JORGE
in:www.galeriavieiraportuense.com

No Caminho, com Maiakóvski

Eduardo Alves da Costa

Assim como a criança
humildemente afaga
a imagem do herói,
assim me aproximo de ti, Maiakóvski.
Não importa o que me possa acontecer
por andar ombro a ombro
com um poeta soviético.
Lendo teus versos,
aprendi a ter coragem.

Tu sabes,
conheces melhor do que eu
a velha história.
Na primeira noite eles se aproximam
e roubam uma flor
do nosso jardim.
E não dizemos nada.
Na segunda noite, já não se escondem:
pisam as flores,
matam nosso cão,
e não dizemos nada.
Até que um dia,
o mais frágil deles
entra sozinho em nossa casa,
rouba-nos a luz, e,
conhecendo nosso medo,
arranca-nos a voz da garganta.
E já não podemos dizer nada.

Nos dias que correm
a ninguém é dado
repousar a cabeça
alheia ao terror.
Os humildes baixam a cerviz;
e nós, que não temos pacto algum
com os senhores do mundo,
por temor nos calamos.
No silêncio de meu quarto
a ousadia me afogueia as faces
e eu fantasio um levante;
mas amanhã,
diante do juiz,
talvez meus lábios
calem a verdade
como um foco de germes
capaz de me destruir.

Olho ao redor
e o que vejo
e acabo por repetir
são mentiras.
Mal sabe a criança dizer mãe
e a propaganda lhe destrói a consciência.
A mim, quase me arrastam
pela gola do paletó
à porta do templo
e me pedem que aguarde
até que a Democracia
se digne aparecer no balcão.
Mas eu sei,
porque não estou amedrontado
a ponto de cegar, que ela tem uma espada
a lhe espetar as costelas
e o riso que nos mostra
é uma tênue cortina
lançada sobre os arsenais.

Vamos ao campo
e não os vemos ao nosso lado,
no plantio.
Mas ao tempo da colheita
lá estão
e acabam por nos roubar
até o último grão de trigo.
Dizem-nos que de nós emana o poder
mas sempre o temos contra nós.
Dizem-nos que é preciso
defender nossos lares
mas se nos rebelamos contra a opressão
é sobre nós que marcham os soldados.

E por temor eu me calo,
por temor aceito a condição
de falso democrata
e rotulo meus gestos
com a palavra liberdade,
procurando, num sorriso,
esconder minha dor
diante de meus superiores.
Mas dentro de mim,
com a potência de um milhão de vozes,
o coração grita - MENTIRA!

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

SEI DE TI por Kim Berlusa

SEI DE TI

Kim Berluss

Sei de ti, pela longa ausência
e pela saudade, por ti expandida
de mim tu nada sabes, mas porém és a indigência
que pintalga e que dá corpo à minha vida.

São as tuas nostalgias e difusas veredas
que subtilmente ladeiam o meu caminho
qual fogo erguido, em indomáveis labaredas
nas quais eu encho os alforges de carinho.

A tua mística e incontornável magia
tem uma magnética força, que me atraí
e a aferição de toda essa energia
é não saber donde ela vem, nem p’ra onde vai.

Sei de ti, mas nem sequer sabia
interpretar os teus silêncios e as tuas imagens gestuais
de mim tu nada sabes, mas digo-te ó poesia
que saber de ti, nunca será demais.

terça-feira, 24 de agosto de 2010

À BEIRA-MAR

À BEIRA-MAR

Irene Costa

A beleza do momento
Guardei num frasquinho
Bem arrolhado,
Para aspirar sofregamente
Quando estiver sozinho,
O ar perfumado!

Com saudade
Partindo o coração,
Tomei-o na mão
E sorvi um arzinho!

Os carneirinhos de pelos brancos,
Correm para a praia
O arrulho do mar, na orla desmaia.
A canção dolente,
No rochedo, a sereia,
A água que beija a língua de areia.

Estavas presente,
O ar perfumado…
O odor do momento
Guardei bem guardado.

A luz nos ofusca,
No horizonte distante
A frescura do mar,
O Sol inebriante.

De velos cor de alva,
Os carneirinhos,
Abraçam o mar,
Muito mansinhos…
Na tarde cor de malva
Uma gaivota esvoaça,
Lançando o seu grito
Por sobre a praça…

“O Livro da Lena”
Maria Irene Costa

segunda-feira, 23 de agosto de 2010

O AMOLADOR de Aurora Simões de Matos por Miguel Leitão




O AMOLADOR

“A... mola navalhas e tesourinhas
Com... põe panelas e alguidares
Arran…ja guarda-chuvas e sombrinhas!...”

Num dia qualquer, bem cedo,
chegava ao Cimo do Povo
o fiel amolador
com seu carrinho de mão
mais o vibrante pregão
que, voando pela aldeia,
anunciava a chegada,
por todos mais que esperada,
que haveria de compor
a já furada candeia
e o velho borrifador.

Tinha a voz inconfundível
com mistura de assobios
feitos de dedos esguios
e a tirada musical
duma gaita especial
soprada bem à maneira
de quem queria ser diferente
no meio da outra gente
e que fazia os delírios
da atrevida criançada
que, à roda dele, se juntava
em algazarra animada.

Mas já chegavam, correndo,
tomando a vez dianteira,
as mulheres atarefadas
por vidas/todas canseira,
com as peças mais variadas
que se possa imaginar:
almotrigas e candeias,

tachos, panelas de folha
e panelas esmaltadas
já velhas, todas furadas
que, depois de muitos pingos
haveriam de durar
por mais uma temporada
pratos partidos em dois
à espera dos agrafos,
pontos com arte bordados
nas caçoilas de Molelos,
assadeiras e alguidares
todos de barro vidrados;
as facas e as tesoiras,
navalhas e canivetes,
tudo, enfim, o que tivesse
perdido o fio e fizesse
falta ao bom do lavrador
e às lides da mulher
na cozinha ou na costura,
trabalhando a vida dura;
guarda-chuvas desvirados,
varetas todas partidas,
sombrinhas desarranjadas,
tudo ficava perfeito
depois de, com muito jeito,
ao seu carrinho apoiado,
de roda sempre a girar,
as mãos do amolador
emprestarem seu valor
à aldeia onde ficava
ao serviço daquele povo
duas semanas a fio
e onde, com muito brio,
punha tudo como novo.
Só depois, nómada errente,
lá seguia sua vida
por outra aldeia... e então
num outro Cimo do Povo
soltava o pregão de novo:

“A... mola navalhas e tesourinhas…
Com... põe panelas e alguidares...
Arran... ja guarda-chuvas e sombrinhas!... ”


Aurora Simões de Matos,
Imagens da Beira-Paiva

El Alazan de Atahualpa Yupanqui por Rosa Guisán

El Alazan

Atahualpa Yupanqui

(Canción)
Era una cinta de fuego,
galopando, galopando.
Crin revuelta en llamaradas,
mi alazán te estoy nombrando.

Trepo las sierras con luna,
cruzó los valles nevando.
Cien caminos anduvimos,
mi alazán te estoy nombrando.
¿ Qué oscuro lazo de nieve
te pialó junto al barranco ¿.
¿ Cómo fue que no lo viste ¿,
¿ Qué estrella andabas buscando ¿.

En el fondo del abismo,
ni una voz para nombrarlo.
Solito se fue muriendo,
mi caballo, mi caballo.

En una horqueta de un tala
hay un morral solitario,
y hay un corral sin relinchos,
mi alazán te estoy nombrando.

Si es como dicen algunos,
que hay cielos pal' buen caballo,
por ahí andará mi flete,
galopando, galopando.

Oscuro lazo de nieve
te pialó junto al barranco.
¿ Cómo fue que no lo viste ¿,
¿ Qué estrella andabas buscando ¿.

En el fondo del abismo,
ni una voz para nombrarlo.
Solito se fue muriendo,
mi caballo, mi caballo.

domingo, 22 de agosto de 2010

Fado falado de Maria de Fátima Gabriel da Rocha



Fado falado

Fado...
Fala de vielas,
Ruas estreitas,
Ruelas
De uma cidade qualquer.

Mas o meu fado
Falado de uma rua larga
De uma saudade amarga
Na vida de uma mulher.

Fado...
Fala de noites perdidas,
Fala de almas vencidas,
Fala de amor
E ciume.

Este fado
Fala disso
E também
De uma paixao,
Que contém
Um coração todo em lume.

O fado conta
A história de um desejo
De alguém
Que quis ter um dia,
Alguém ,
A quem pertencer;
Vivendo a esperança,
Mas uma esperança vazia
De esse desejo, um dia,
Poder vir a acontecer.
O fado chora
Lembranças
Da rua larga
Onde uma bela mulher
O seu homem esperava
Para trocar com ele
Os seus abraços
E doces beijos
Enquanto a namorava.

O fado lembra
O seu Amor
Que ela adora,
Mas que já não espera agora
Na rua larga da vida,
Porque essa rua
Que dantes era perfeita
É agora rua estreita
Pela saudade envolvida.

O fado vive
Na alma dessa mulher,
Porque ela não vai esquecer
Este passado feliz
Em que a paixao
Seu coração comovia
Sempre que ele lhe chamava
“A sua querida Maria”

07/09/05 Maria de Fátima Gabriel da Rocha

sábado, 21 de agosto de 2010

SINA DO POETA E DO PINTOR de Lourdes dos Anjos


SINA DO POETA E DO PINTOR

Lourdes dos Anjos

Na tela, há poemas sem palavras
Há traços e passos que se cruzam
Há gritos mudos escritos em côr
Há braços e laços que enchem espaços
Há lágrimas quebrando a secura
Há retratos da alma, numa pintura.
E há poesia sem rima, e caprichos de pincel.

Há diferentes tons em olhares enevoados
Há, na alma, paz e punhos cerrados
Há caminhos de amor e atalhos de sofrer
Há riscos de luz num sorriso qualquer
Há nuvens negras carregadas de esperança
Há todas as letras de liberdade e vingança.
E há caprichos dos sentidos que esvoaçam.

Esta é a sina do poeta e do pintor:
Ser gente com vidas rasgadas, fingidas a rigor
Gritar palavras, violentamente, silenciadas
Lançar ao vento, as cinzas de asas queimadas
E, dar voz aos sentimentos escondidos no Arco-Íris.

PORTO,20 DE AGOSTO DE 2010


PARA A GALERIA VIEIRA PORTUENSE E PARA TODOS OS ARTISTAS QUE AQUI NOS MOSTRAM A ALMA, COM A ENORME AMIZADE DE: MARIA DE LOURDES DOS ANJOS

sexta-feira, 20 de agosto de 2010

POESIA ARCO-IRIS DA ALMA

VICTOR SILVA BARROS


POESIA ARCO-IRIS DA ALMA

Ponho nas minhas telas toda a cor
Que tiro do meu cofre de riqueza
Pinto com um pincel de puro amor
Um Arco-íris de grande beleza!

P'las vertentes da vida e, ao sabor...
Correntes de água, tão cheias de pureza
Reproduzem na cor da simples flor
Hinos de Amor e Paz à Natureza!

A preto e branco, dores e alegrias
Quando vejo as paletas mais sombrias
Novas cores misturo em minha tela...

Dessas tintas que trago no sentido
Na Poesia ponho todo o colorido
Na Galeria da Alma se pincela!

Maria José Fraqueza - Algarve

quinta-feira, 19 de agosto de 2010

POESIA NA GALERIA NO DIA 21 DE AGOSTO PELAS 17 HORAS


Com a coodenação da pintora naïf Constância Nery e realização do poeta Jorge Vieira, mais uma vez a Galeria Vieira Portuense leva a efeito um sarau cultural com poemas, fado e música Anglo-Saxónica.
Estarão presentes os poetas: Adriana Reis, Cidália Santos (com poemas dos irmãos Castro), Constância Nery (dirá um poema de Athaualpa Yupanki e José Angelo Potiens, escritor e poeta paulista, que no momento está lançando um livro), Jorge Vieira, Lourdes dos Anjos, Lourdes Rocha, Luiza Mendonça, Paulina Sousa, Maria Antónia Ribeiro e outros cuja participação está pendente de confirmação.
Serão ditos poemas de Silvino Figueiredo que por razões pessoais não pode estar presente, mas enviou poemas destinados a este sarau.
Os fados e a música estão a cargo de Emídio Rodrigues e sua guitarra.
Serão benvindos outros músicos e poetas que para participarem só terão de inscrever-se, no início do evento, junto da encarregada da galeria, Dra. Daniela Lima.

OUTRAS VIOLÊNCIAS de Lourdes dos Anjos

Sara Garrote (Chuca)
in: http://ajudacomarte.blogspot.com
OUTRAS VIOLÊNCIAS

Olha-me nos olhos.Em silêncio, com calma.
Abre, para mim, a janela da tua alma.
Agora diz-me, mãe: achas que eu mereço,
Sempre que te convém, ser arma de arremesso?
Porquê,mãe?Porque me fazes sofrer?
Porque te vingas e me proibes de o ver?
Que fiz, mãe, diz-me o que fiz,
Para não me deixares ser feliz?
Será que ainda não conseguiste entender
Que sou gente e não um objeto qualquer?!
Pára. Não me tentes mais manipular.
Dá-me espaço e tempo para pensar.
Se o vosso amor, precocemente, acabou
Se, de repente, o nosso lar se desintegrou,
Eu quero continuar a ter Pai e Mãe.
Amo um e amo o outro também.
Quero sentir-vos os dois a meu lado
Mesmo sabendo que sois um casal separado.
Tenho direito a ser feliz, a ser criança...
Não admito servir como uma reles vingança...
E, não me ameaces nunca, nunca mais,
Com polícias, juízes e tribunais
Porque apenas sei, que ninguém quis saber
Que a vossa liberdade se fez à custa do meu sofrer.
Também não me voltes a perguntar qual dos dois eu amo mais
E, por favor, poupem-me da guerra das visitas quinzenais
E, até aquela conversa: ele que pague porque tem obrigação
Faz-me pensar que sou, um simples imposto de circulação.
Estou cansado de tanto egoísmo, tanta cegueira
Só peço que me amem, cada um à sua maneira.
Tu, mãe, a quem confiaram o poder paternal,
Não faças da minha vida, um tempo quase infernal.
E tu, pai, não te esqueças das vezes que adormeci
Chorando a saudade imensa, de estar longe de ti
Se vocês fizessem ideia do peso do meu sofrer,
Percebiam porque desejo, para vos magoar, morrer!

Os filhos não guardam sempre este verbo infantil.
Crescem e, de repente,são bandos de delinquência juvenil
E porque não têm raízes nem laços de união
São a revolta que vagueia nas celas duma prisão

É urgente soletrar, devagar, algumas palavras:
Família,Tolerância,Sacrifício, Humildade,
Pai, Mãe, Amor, Futuro, Felicidade.
É urgente, repensar, diferentes formas de AMAR

LOURDES DOS ANJOS in POETAS DE SEMPRE

domingo, 15 de agosto de 2010

Auto-conhecimento

Victor Silva Barros
in: http://victorsilvabarros.blogspot.com/

Auto-conhecimento

Silvino Figueiredo (o Figas)

Melhor amigo não tenho
Que a própria consciência
É com ela que me avenho
No bem e na indecência

A PALAVRA

Carlos Dugos
in: http://eaobranasce.blogspot.com/

A Palavra

Silvino Figueiredo (o Figas)

A palavra é átrio de entrada
Onde outras palavras entram
Esperando que alguém as apresente
Ou represente
Que lhes dê a mão
E as guie até ao lugar
De seu exacto significado
Da sua real intenção.

Uma palavra só
Só uma palava
É nada
Ou é algo com acção
Ou então
Não passa do átrio d’entrada

Palavra só não faz ária
Nem cantoria
Nem poema
Nem poesia
Uma pedra só
Não faz jogo de dominó.

Palavra só
É como um só camelo
No deserto
Não faz caravana.

Uma palavra só
Não tem chance
De romance.

A palavra amor
Por exemplo
Até pode significar
A abóbada dum templo
Mas a palavra amor
Sozinha
Isolada
Sem mais nada
É comezinha
É nada.

Uma palavra
Precisa de acção
Doutra palavra
Estar acompanhada
Por exemplo
Com a palavra fazer.

Então sim,
Uma à outra ligada
Formam uma caravana
Que levará o amor ao seu templo:
À cama
Ou até mesmo
À caravana...
Com camelos a ver...

ROSA AZUL

Sara Garrote (Chuca)
in: http://salaodaprimaverade2011.blogspot.com/
Rosa Azul

Silvino Figueireo (o Figas)

De tanta flor
Que há na natureza
Elejo a rosa
De todas as cores
Do arco-íris
Prefiro o azul
A flor do meu amor
É a rosa azul
Flor de rara beleza
Que reina de norte a sul

A flor do meu amor
É azul como o céu
Límpido
No azul da vida
Diáfana
Querida
Vive ela e vivo eu
Caminhando
Sobre o tapete verde
Da esperança
Por vezes, pincelado
Ao de leve
Pelos amarelos outonais
Outras, disfarçado
Sob o manto branco
Da neve

domingo, 8 de agosto de 2010

PALAVRAS DITAS E NÃO DITAS de Miguel Leitão


TESSA DOMENE MORIS
in:http://salaodaprimaverade2011.blogspot.com

PALAVRAS DITAS E NÃO DITAS

Miguel Leitão

As palavras que dizemos são
Balões soltos no ar,
Forças vivas,
Coloridas,
Flores erguendo-se à luz em tardes cheias de sol.
Pombas mansas de afeição, trazem
Lembranças, recados,
Doces mensagens a alongar a amizade e a
Encurtar a distância entre as pessoas que se querem.

Cortantes, frias, geladas,
As palavras que dizemos,
Às vezes, são navalhadas,
Golpes certeiros de lâmina,
Gume afiado a abrir chagas
Sangrentas,
Incuráveis,
Na alma de quem as ouve.

As palavras que escrevemos são
Velas içadas ao vento,
Barcaças a navegar em rios brancos de papel
E a lavrar em suas águas
Profundos sulcos
Falantes,
Repletos de sentido.

Com as palavras que escrevemos,
O branco rio inexpressivo,
Cinzento,
Abre-se em cor e ganha voz.
Fica com alma
E todo ele é um arraial,
Um alvoroço,
A prenunciar emoções
E aventuras sem limites.

Desobedientes,
As palavras que escrevemos
às vezes perdem o rumo,
Hesitantes, inseguras,
Debatem-se em espirais,
Carentes de significação e de norte:
Dobram-se, enrolam-se,
Contorcem-se,
Volteiam e, sem pujança,
Pairam à deriva,
Ao sabor de tempestades
Que as arrastam, dilaceram e sufocam.

Silenciosas,
As palavras que calamos são
Pólvora seca,
Armadilhas,
Bombas camufladas cá dentro
E prestes a explodir.

As palavras por dizer,
Gritos mudos que abafamos
A queimar em nosso peito,
São emboscadas perigosas.
Como brasas sob cinzas,
São disfarces,
Embustes a encobrir ódios e a
Esconder raivas antigas.
São vulcões adormecidos
A ruminar lavas medonhas,
Escaldantes,
E com a malvadez a trair-se na cratera do olhar.

Há ainda outras palavras,
Ocas, coitadas!
Que nada querem dizer.
Sem cor e sem expressão
São como cestos vazios,
Papel de embrulho enlaçado
Sem conter nada por dentro.

Essas palavras balofas,
Vagidos insignificantes
De quem simplesmente abre a boca
E diz coisas por dizer, são
Um pôr cá fora,
Um desejo para a rua que não afecta ninguém.

Pobres palavras inofensivas que já ninguém
Toma a peito e que…
…nem o vento quer levar.

do livro de poemas "Em Nome das Palavras"

LINHA DO MAR de Miguel Leitão

Carlos Dugos
in:http://eaobranasce.blogspot.com/
LINHA DO MAR

Miguel Leitão

Dilato os olhos,
Fascinados!

Percorro o azul que se oferece
Na pureza da ampla curva
Horizontal,
Alongada,
Aberta:

- a fronteira entre o céu e o mar.

Assim teu corpo,
Viola curvilínea,
Fascinante,
Distendida,
Oferecendo-se a meus dedos
Que acendem na noite baladas de fogo,
Baladas de amor:

- a fronteira entre a vida e o sonho.

do livro de poemas "Em Nome das Palavras"

PALAVRA AMOR de Miguel Leitão

Victor Silva Barros
in:http://victorsilvabarros.blogspot.com/

PALAVRA AMOR

Miguel Leitão

Perde-se o amor nas palavras
Que ferem, que matam, destroem.
Perde-se o amor nas palavras
Que são matéria, artifício, invento.

Amar não se traduz por palavras.
Dizer que se ama pode não se amar
Como dizer que se crê em Deus pode não ser crer nele.

Amor não são palavras
Porque as palavras não são nada
E o amor é.

As palavras enganam, deturpam
E o amor é silêncio vivido.

O amor não tem boca,
O amor não tem ouvidos,
O amor só tem alma e mãos para dar.

Se amar fosse palavra,
O articular “amor” duraria a vida inteira!

do livro de poemas "Em Nome das Palavras"

sábado, 7 de agosto de 2010

NASCI AQUI de Jorge Vieira

Pilar López Román
in:http://artistasdacorunhanoporto.blogspot.com/

Nasci aqui!

Jorge Vieira

Nasci em Miragaia, perto do rio
Num hospital em pedra, enegrecido;
À sua volta o velho casario,
Traz memórias de um tempo percorrido.

Tudo é diferente e a minha memória,
Não encontra razões para o descrever,
Aquele velho tempo, a sua história
A força e a razão do meu viver.

Sai desta cidade, era jovem ainda
Para as terras da África perdida;
Regressei e não consigo ainda
Aceitar esse outro sonho, a minha vida.

Foram anos, vencidos e amordaçados,
Longe da minha cidade, Porto nascente;
Ficaram todos os anseios sepultados,
À espera que acorde o meu poente.

Mas agora tudo é bem diferente,
Eu amo este meu Porto, a minha cidade,
Hospitaleira e onde toda a sua gente,
Tem o seu orgulho, sua vaidade.

DEIXAI-ME VIVER de Jorge Vieira

António Lino

Deixai-me viver

Jorge Vieira

Deixai-me voar por novas paragens,
Ao encontro de um novo alvorecer;
Com o meu olhar percorrer paisagens
E sentir a força do meu querer.

Deixai-me sonhar por outras margens,
Longínquas, ignotas e por explorar;
Ir à procura de novas miragens
Para que o meu olhar possa repousar.

Deixai-me ser livre e poder sentir,
Uma nova terra, um novo anoitecer,
Não ter o tempo preso, senti-lo fugir,
Para depois nele, sobreviver.

Deixai-me mudar de rumo, para sonhar,
Sentir a vida plena de emoções;
E quando dessa longa viagem regressar,
Eu possa abraçar as multidões.

OLHAR DE CRIANÇA de Jorge Vieira

GISELLE DUMONT REIS
in: http://salaodaprimaverade2011.blogspot.com


Olhar de criança


Jorge Vieira

Todo o olhar da criança encanta,
As páginas da nossa vida;
Qual doce e eterna canção
Aguarela colorida.

Há caminhos de paz e amor,
Na primavera do seu despertar,
Onde todo o ódio e o rancor
Não se fixam no seu olhar.

No olhar da criança, a ternura
Viaja para dentro de nós;
Qual imenso jardim de verdura,
Onde nunca estamos sós.

Criança, que um dia irás crescer
Abraça o amor e a alegria;
És a força do nosso querer
E a nossa eterna companhia.

NUMA TRAINEIRA de Jorge Vieira

Cassio Mello

Numa traineira


Jorge Vieira

Vou pelo mar fora, numa traineira
E sinto um forte cheiro a maresia;
No céu cintilam estrelas, qual sementeira
De luzes, que brilham em sintonia.

No meu navegar, recordo as ânsias perdidas
E oiço uma canção de madrugar,
Que suaviza a dor das minhas feridas
E me põe perdido no meu sonhar.

No sulcar das ondas e nessa traineira,
Soluçam ais e alguns lamentos,
E a lua que brilha tão altaneira,
É a companhia dos desalentos.

Na força de um querer, regresso ao cais
E vejo o olhar cansado do pescador;
No seu peito morrem todos os ais,
Pois a vida agreste cala-lhe a dor.

Comboio… que parte de Jorge Vieira

Carlos Godinho
in: http://carlosgodinhonoporto.blogspot.com/

Comboio… que parte


Jorge Vieira

Em cada comboio que parte,
Há mãos em desalinho que acenam;
Festa de emoções que se reparte
Por corações que ansiosos esperam.

Em cada comboio que percorre,
Qualquer linha e para qualquer lugar;
Há sempre uma paisagem que se descobre
No colorido do nosso olhar.

Em cada paragem, em cada estação
Há encontros furtivos ou demorados;
Um abraço mais forte, um apertar de mão
Cobertos de silêncios magoados.

Em cada regresso, fica sempre a saudade
De uma viagem sempre adiada,
Presa à ousadia da nossa vontade,
A festa da vida inacabada.

LETRA A LETRA NASCE O TEXTO de Miguel Leitão

José González Collado

LETRA A LETRA NASCE O TEXTO


Miguel Leitão

Letra a letra a casar sílabas
Se vão construindo as palavras
- a outra face do espelho
Do nosso mundo mental.

Palavras que ancoram coisas,
Arrastando-as até nós: paisagens,
Homens e bichos;
Casas, cidades, nações,
Montanhas, nuvens e mares,
Alegrias e pesares;
Projectos e aspirações…

Tudo fica à nossa frente
Por milagre das palavras!

Enfileiradas,
Em linha,
Vão-se transformando em frases:
Desejos, ordens, perguntas,
Negações e
Afirmações portadoras da verdade
Por que alguns homens se batem.

Frases que fazem sentido e que
Podem ferir como espinhos
Ou facas em nosso peito!
Ás vezes sabem-nos bem,
Como veludo macio a roçar em nossa pele,
Ou como iguarias de mel
A adoçar-nos a vida!

Juntando-se umas às outras,
Aves de Outono em bandos,
Vão cumprindo o seu destino.

Elevam-se, pairam, volteiam, mas
Fiéis à sua rota,
Acabam por desaguar
Em textos que falam do mundo
Lá de fora e cá de dentro.
(Qual deles mais importante?
Qual deles será mais real?)

Afinal
Todo o discurso:
Vidas descritas, narradas,
Cochichos de amor e canções;
Negociações conversadas,
Louvores e representações;
Sermões pregados no púlpito,
Simples notas de encomenda ou
Cartas comerciais;
Escrituras de notário,
Notícias, revistas, jornais,
Apontamentos diários,
Conferências, actas, lições,
Ciência deixada aos vindouros
Ou saber proverbial;
Poemas saídos do peito
Romances, dramas, comédias…

Tudo tem na sua base
Pequenos trejeitos de boca,
Ligeiros gestos de dedos!

Ar e tinta…
… nada mais!

do livro de poemas "Em Nome das Palavras"

A FESTA DA VIDA de Jorge Vieira

José González Collado


A festa da vida

Jorge Vieira

Fazei da vida uma grande festa
Porque o estarmos cá, o existir
E a morte, aquilo que nos resta
É ter que aceitá-la e saber partir.

Viver em harmonia fraternal
Em cada dia que passa, irreverente,
É afastar todo o instinto do mal
É viver feliz por entre a gente.

Essa gente, que não ousa aceitar
As contrariedades da vida,
Perde toda a essência do seu sonhar
E traz alegria dividida.

Nas ondas da nossa ansiedade,
Saibamos viver em comunhão,
Fruto e razão da nossa verdade
E a inquietude do nosso perdão.

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

RENOVOS de Miguel Leitão

Angelina Gomes
in:http://salaodaprimaverade2011.blogspot.com/

Vieste a cavalgar numa aragem de sol e
Derrubaste os muros que me
Cercavam no meu
Quintal quotidiano.

De repente fez-se dia.

Ergui-me e
Percorri trilhos de luz
E de promessa.

Do chão surgiram esperanças
E todas as primaveras floriram.

do livro de poemas "Em Nome das Palavras"