sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

CASA DA RASTEIRA É A SOMBRA

Pedro Charters d'Azevedo
CASA DA RASTEIRA É A SOMBRA

Nasceu e cresceu rasteira
Posição horizontal
A tentativa primeira
Foi um fiasco total
A árvore que a encantou
Permaneceu afastada
Ao seu corpo se agarrou
Sonhando ser respeitada
Mas o forte tronco astuto
Orgulhoso se ergueu
Seus galhos, folhas e frutos,
Lhes deram sinal de adeus.
Crescia triste e rasteira
Quando, para seu espanto,
Sorriu-lhe o botão à beira
Fugiu feliz do seu canto.
Foi crescendo orgulhosa
Pisando folhas e espinhos
Até sentir-se formosa
Para o encanto do vizinho.
O simples botão trigueiro
Deu-lhe amparo, carinho
Entregou-se por inteiro
Abrigou-a no seu ninho.
Ela engordava e crescia
Manhosa, engolia tudo
E com tanta cortesia
Cuidou do seu conteúdo.
Brilhava agora a rasteira
Conquistando multidões
No tronco de uma roseira
Colheu muitos corações.
Sempre maldosa e matreira
Entregou seu novo amigo
À dor, à mágoa e a tristeza
Roubou seu próprio abrigo.
Chorou o chão que a acolheu
O mesmo chão que a criou
Sorvendo o forte veneno
Percebendo o desamor.
Em resposta e com descaso
A rameira gargalhou
Não sabias por acaso
Que cobra fui e cobra sou…

Constância Nery
lido por Maria Antónia Ribeiro

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