quarta-feira, 11 de abril de 2012

O TRASEIRO DA ERMELINDA

O TRASEIRO DA ERMELINDA

Puseram no meu caminho esta vila
esta rua pequenina, este sol, este recanto
era o trajecto antigo dos andores
dos funerais a pé, dos mil sabores
da fruta e que era dos senhores…

Puseram no meu caminho estas vidas
e Se Ritinha, a Claudina, o Mataafonso
queridos personagens duma infância torta
com o som dos pardais, dos grilos, dos pedreiros.
E eu não sabia de outra felicidade
que não fosse ver passar o rabo da Ermelinda

Puseram no meu caminho esta sorte
de ter fome e ter desejos e ocultá-los
naquela infância florida, aventurosa
cujos aromas sãos me adoçaram vida

Agora quero cismar que ainda existe
uma tal vila e essa rua, esse recanto
onde nada do que vivi, hoje subsiste
a não ser o Torne mas agora sem encanto.
Puseram no meu caminho a terra mais bonita
mas que não durou o espaço de uma vida
as suas casas partidas e arrombadas
as suas gentes falecidas e enterradas
e o traseiro da Ermelinda nunca mais passou
frente aos meus olhos totalmente embevecidos.

Fernando Morais
in "O Poeta Escondido"

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