sexta-feira, 25 de maio de 2012

NOCTURNO


NOCTURNO

Eram, na rua, passos de mulher.
Era o meu coração que os soletrava.
Era, na jarra, além do malmequer,
espectral o espinho de uma rosa brava…

Era, no corpo, além do gim, o gelo;
além do gelo, a roda de limão..
Era a mão de ninguém no meu cabelo.
Era a noite mais quente deste verão.

Era, no gira-discos, o Martírio
De São Sebastião, de Debussy
Era, na jarra, de repente um lírio!
Era a certeza de ficar sem ti.

Era o ladrar dos cães na vizinhança.
Era, na sombra, um choro de criança. 

David Mourão-Ferreira
(1927-1996)
lido por Amândio Vasconcelos

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