NOCTURNO
Eram, na
rua, passos de mulher.
Era o
meu coração que os soletrava.Era, na jarra, além do malmequer,
espectral o espinho de uma rosa brava…
Era, no corpo, além do gim, o gelo;
além do gelo, a roda de limão..
Era a mão de ninguém no meu cabelo.
Era a noite mais quente deste verão.
Era, no gira-discos, o Martírio
De São Sebastião, de Debussy…
Era, na jarra, de repente um lírio!
Era a certeza de ficar sem ti.
Era o ladrar dos cães na vizinhança.
Era, na sombra, um choro de criança.
David
Mourão-Ferreira
(1927-1996)
lido por Amândio
Vasconcelos
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