O meu amor não cabe num poema – há coisas assim,
que não se rendem à geometria deste mundo;
são como corpos desencontrados da sua arquitectura
ou quadros que os gestos não preenchem.
O meu amor é maior que as palavras, e daí inútil
a agitação dos dedos na intimidade do texto –
a página não ilustra o zelo do farol que agasalha as baías
nem a candura da mão que protege a chama que estremece.
O meu amor não se deixa dizer – é um formigueiro
que acode aos lábios como a urgência de um beijo
ou a matéria efervescente dos segredos; a combustão
laboriosa que evoca, à flor da pele, vestígios
de uma explosão exemplar: a cratera que um copo,
ao levantar-se, deixa para sempre na vizinhança de outro corpo.
O meu amor anda por dentro do silêncio a formular loucuras
com a nudez do teu nome – é um fantasma que estrebucha
no dédalo das veias e sangra quando o encerrem em metáforas.
Um verso que o vestisse definharia sob a roupa
como o esqueleto de uma palavra morta. Nenhum poema
podia ser o chão da sua casa.
Maria do Rosário Pedreira
in "O Canto do Vento nos Ciprestes"
Ana Almeida Santos
Sem comentários:
Enviar um comentário