terça-feira, 6 de março de 2012

AMIZADE (prosa)

AMIZADE (prosa)

Nesta tarde solarenga e outonal, no momento em que o Sol atinge o auge na ostentação, sentada sob o alpendre da minha casa, defronte a uma mesa cansada e apoiada sobre três pernas de ferro, tenho entre mãos um gaipo de uvas frescas, gordas e doces. Trinco-as, escorrem seu suco pelos cantos da boca e enquanto as saboreio assolam à mente imagens, ideias sobre a amizade.
Sobre a mesa há um vaso de barro de Barcelos com sardinheiras rosa púrpura, uma taça de uvas cristalizadas, puros cristais de açúcar que não fazem mal à saúde, frutose e  um copo de vinho puro, essência e alegria da vida nas proporções certas.
Dádivas na troca de amizade.
Lembro da videira, planta que simboliza a vida, quando plantada em terra fértil, banhada pela luz do Sol e bem adubada enraíza e cresce firme.
O Sol como pai procura com nada faltar, para que sua luz faça ramificar e abrir para a vida. A mãe terra é essencial na origem de bons frutos e bons frutos sejam. Tudo depende da alimentação e educação na medida certa.
Sendo boas dão cachos fortes de uvas gordas em sabedoria e saber estar.
Ao trincar encontro grainhas, sãos os contratempos, quem os não tem?
Ninguém não é perfeito e apartados atempadamente darão boa semente.
Ao longo da vivência da uva como na amizade, ela é afectada pela filoxera, insecto alado que voa sobre tudo, difusor da infestação do pior, mau exemplo, causador de doenças como o oídio, este só danifica superficialmente mas há os vulneráveis, os influenciados, os sem defesa própria e a esses penetra seu interior, nos grãos da uva e ficam danificados para sempre, não deixam frutificar, o míldio. São hospedeiros, vivem à margem sugando os outros no todo.
Ninguém é imune, há que podar e vacinar.
Não é qualquer pintor que pinta telas nem na tela da minha amizade. Tem que ter escola de fina estirpe e saber estar. Selecciono.
As uvas quando maduras, no ponto certo em dar seu suco, o melhor do seu interior e nalguns casos vinho de requintada fineza, seiva que alegra todos, há alegria na família e amigos, no sacrifício do apartar da videira e no encetar de nova etapa, os amigos são importantes                                                                 ao longo da vida.
Que alegria há nas vindimas.
Outras uvas ficam nas videiras cristalizando seu interior, uvas amadurecidas pelo saber próprio e do tempo.
O livro da vida é que nos ensina mais e melhor.
É bom saborear na boca os cristais das uvas passas, as palavras sábias e, tanto nos ensinam os anciãos.
Seu saber é açúcar, é mel na vida e mesmo do bagaço, do restolho que pensamos nada servir, nada dar, após espremido, bem espremidinho e elevado a altas temperaturas dá o álcool, aguardente, a alma da alegria.
Tudo na vida tem seu valor na medida certa e nos erros crescemos.

O vinho alegra e conforta,
quem com cautela dele o usa,
nascido da cepa torta,
entorta quem dele abusa.
(popular)


Fernanda Garcias 2012 / 02 / 17

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