quarta-feira, 20 de junho de 2012

CÂNONE II

CÂNONE II

Deixa meu amor o teu pensamento ser montanha
Que terei de vencer palmo a palmo
Deixa o teu espirito ser o meu país de ausência
Onde por muito que caminhe nunca chegarei
Deixa meu amor que te leia sílaba a sílaba
Como quem lê Daniel Filipe, Veiga Leitão, Mário Claúdio, Sophia,
Saramago
Deixa o teu sonho ser gôndola que leva a fantasia
Por esta veneza que é o meu corpo
Deixa meu amor o teu corpo sentir o clima agreste do Tibete
Para bem dentro de mim te abrigares
Deixa que os nossos espasmos, gemidos, gozos
Sejam a “Canção da Terra” de Gustavo Mahler
Deixa meu amor que o teu viver seja como o Rio de Ouro
Que corre entre escarpas, feroz manso belo e dourado
Deixa que os teus olhos vejam o arco-íris que une duas cidades
E vê-me na minha rua na “Ribeira do Mestre Resende”
Deixa meu amor o Ontem ser Hoje e caminharemos
De mão na mão ao longo de um rio através da noite até ser dia
Deixa que eu rompa os muros do silêncio num teclado qualquer
Assim na noite dos teus olhos tão impudicamente puros
Deixa meu amor lembrar-te o poema de Luís Veiga Leitão
A uma bicicleta desenhada na parede da prisão “mas que era um carro”
Deixa-me cantar-te como se canta o Homem amado – Amo-te!
Como se canta o Homem esperado – Quero-te em mim!
Deixa meu amor ser a que te espera e que na impaciência
Roda os ponteiros do tempo como pintou o Armando Magno
Deixa-me ser a Mulher pedra, terra, norte, Gaia
Com a cor o movimento o espanto que tu viste à Anabela
Deixa meu amor ao fim do dia ser gaivota dourada do Mestre Zé
Rodrigues
Para repousares no meu corpo feito cais
Deixa que a saudade de um tempo no tempo
Volte a ser realidade e o tempo seja Hoje
Deixa amor os teus olhos profundos como um rio
Recolherem-se nos meus olhos; e fica-te em mim
Deixa que os nossos corpos sejam fogo
Para nele nos fundirmos dos pés até ao beijo
Deixa meu amor que os nossos corpos sejam um só beijo
E neste fusão dos corpos em Harmonia
Tal Cânone dos sentidos e aconteceu o espanto
O espanto em que fiquei quando te vi e toquei
Com os meus olhos feitos dedos
Em ti feito estátua de bronze
                        Tal Cânone da Harmonia

Tudo aconteceu
Quando vi
Obra da escultura Margarida Santos
“Cânone da Harmonia”

Aurora Gaia

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