sexta-feira, 7 de outubro de 2011

“ O PORTO DE HÁ 41 ANOS”


“ O PORTO DE HÁ 41 ANOS”

Poema que Obteve o 1.º PRÉMIO EDP DE POESIA


Aqui nasceu Portucalem!
Não há vozes que não falem
deste rochedo imponente!...
O Porto e a sua gente
cresceu e se enraizou,
e com almas alicerçou
até pela rocha dentro
a Ribeira até S. Bento!

Banharia, Rua Escura…
mesmo mudada a moldura
mais triste o quadro ficou.
Quem, triste, assim o pintou?
Liga a S. Sebastião,
onde as moças de cartão
se debruçam na janela
da velha casa amarela.

Vímara Peres não podia,
por artes de fantasia,
apear-se do cavalo;
de um lado vendem robalo,
do outro vendem repolho!...
E por mais que se apure o olho
não se vislumbra na Sé
um sítio onde pôr o pé.

Mulherio do Barredo
brada na língua um segredo,
entre piscadelas de olho,
enquanto cata o piolho;
e a arguida na falação
vomitando palavrão
agarra, lesta, a melena
e há zaragata na arena.

Nas escadas das Verdades,
oh quantas calamidades!...
Quanta alma ali urdina
uma vida de mentira…
- Olha o Carlinhos da Sé
querendo ser quem não é!...
- Olha a Fernanda Maluca
que mudou a cor à peruca!...

Subo à Serra do Pilar,
dou um banho ao meu olhar
e perco ideias de grandeza
diante de tanta nobreza!
Sinto em minha pequenez,
ao ver-te de cada vez,
ser a primeira, em verdade,
que te descubro, cidade!

Pela ponte de D. Luiz,
como um ramo sem raiz,
fico nas grade em suspenso;
sinto a vertigem, não penso,
e assim entregue às alminhas
chego, enfim, às Fontaínhas.
P’ra mim é sempre odisseia
Passar a primeira ameia.

Rua do Sol, ou candeia?...
nem o calor de uma ideia;
num extremo não há nada
E o outro leva á esquadra…
Aliados, quem diria?...
Há sempre pancadaria!...
E num dia de reunião
houve até morte e traição!

Rua Chã, mas que maneiras…
dirá que é só de parreiras
quem por acaso passou,
o chã que ali se tomou!
Dá p’ra Rua do Loureiro
onde as meninas do meio
vivem mostrando a cueca
a troco de meia leça.

E do principio até ao fim,
na Rua do Bonjardim,
nem um toque de verdura,
nem um laivo de ternura
vindo do nome que tem.
Olho as fachadas, ninguém
tem a ideia amorosa
do cultivo de uma rosa!...

Todas vão dar à Avenida,
ruas com seiva de vida,
mas sofrendo colesterol.
E p’ra ir ver o pôr do Sol,
pode-se ir pela Boavista,
que o encanto paisagista,
desde que ainda haja vaga,
por enquanto não se paga!

Os Clérigos e os Leões
Lembram ’inda as multidões,
Carnificinas insanas
Das crueldades romanas!
Os leões a jeito esperam
voltar a ser o que eram
e reviverem a cena
dos cristãos mortos na arena!

Quase que já me esquecia
da rua dita Alegria!
Não tem jeito, tão sem graça,
anda apressado quem passa
como fugindo à tristeza…
Vem do Marquês, cujo marquesa
não tem nome nem fez truques,
cedendo o lugar aos duques.

De Palmela… de Saldanha…
quantos a malta arrepanha
no correr da nossa história;
quantos mais… maior a glória!...
“Biba ó Porto, biba ó Porto!”
O tripeiro mesmo torto
diz ser direito, diferente!
Viva então a nossa gente!...

Maria de Lourdes Martins

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