ACONTECEU?
A história da cidade
e plenitude
real imaginado invasão
um soluço de mágoa pelo tempo
do que foi verdadeiro
e aconteceu.
Terá sido a cidade invadida
Ocupada realmente conquistada
Terá resistido lutado ferozmente
Ou apenas esboçado um gesto, um só
Fotografamos a cidade não as ruas
Fotografia de conjunto não as casas
Abraçamos, apertamos cerrados o nó
Ao luar e à névoa neblina Dezembro
O invasor presente nada reclamou
Conquistador de tudo escasso recupera
E não exige nem saqueia nem reclama
Sentado no espaldar do poema
Com o pé esmaga o seu discurso
Não toma posse chaves da cidade
À bandeira branca assoa-se calmo
Distraído nas coisas do passado.
Ter-se-ia simplesmente esquecido
De tanto que tem hoje à mercê
Não abusa da força e da vitória
Dono e senhor da terra cobiçada…
É poeta. – dizem os de fora –
História da cidade está nas pedras
Ou nos arquivos que ficaram recobertos
Cidade da papelada e telhados
Num longo murmúrio acontecido
É o que vemos e temos no presente
Ou o que dizem afirmam era antes
A trepadeira verde cresce nos papéis
Ou são flores e algas de leitura?
Será verdade que existiu uma cidade
Aqui onde vemos montes de poesia
Devemos revoltar-nos também contra poeta
Habituados como estamos à revolta?
ou será que é vento e seus aromas
e alecrim na seiva perpetuado
podendo fazer novos livros dessas folhas
e vendê-los a outras vilas e cidades
ou dá-los naturalmente a quem é longe
oferecê-los, trocá-los por comida
negociar a dor e o desespero
antes da trovoada vir irresistível
dum oriente de roupas agitadas
como peixes voadores entre nuvens
saxofone atira notas requebradas
por entre filas e filas de mistério.
Fernando Morais
in A Cidade Ocupada pela Poesia
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